quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Caos e ciberespaço


  Vício em computadores; mudanças nos relacionamentos intra e interpessoais; transformações cognitivas e comportamentais; mudança de hábito: culpa da Internet?
As queixas são inúmeras e não deixa de ser uma grande verdade que, em muitos casos, as formas de comunicação básicas estão sendo substituídas, nas relações humanas, pelo teclado do computador, celulares, etc. Os adolescentes o fazem (apontam pesquisas) por, basicamente, dois anseios:

·      *  Sensação de poder: controlar a máquina e colocar em congruência o que você é, com aquilo que quer ser. Constrói-se, não somente, uma imagem externa mas, sua auto imagem pois, qualquer interação promove uma mudança, mesmo naquele que criou uma ação;

** Sensação de pertencimento: desta forma, pode-se criar uma outra imagem, num mundo em que as pessoas aceitarão pois, é construída a partir dos padrões impostos pela sociedade.  São atitudes tomadas paralelamente a uma extensão de si; auto (re) criação, ou complemento sendo a internet utilizada de forma a sabotar, rastrear pessoas, etc.

      Comenta-se muito sobre esse comportamento no caso de adolescentes. No entanto, as pessoas parecem estar perdendo o foco e repousando seus olhares no meio/ mensagem e não no sujeito. E essa é uma grande pegadinha:

Muitos dos pais que reclamam desse novo "hábito" adquirido por seus filhos, agem da mesma maneira, podendo chegar até ao ponto de, não travarem contato visual com os filhos, minando a paciência que já minguava na educação dos mesmos. Sabemos que para "exemplificar" precisamos (inter) agir, não falar. Assim como dissemos antes: as transformações ocorrem a partir da interação, se os pais interagem com o meio em que os filhos estão inseridos (mesmo que não diretamente com estes) desta maneira ou, até mesmo, "ausentes de si", como poderão compreender o momento atual ou mesmo, exigir algo diferente das crianças, tão autônomas e cheias de razão?
Muitos casais se desfazem e acredito, que algumas vidas ou dignidades, também (em casos não revelados ou não divulgados, por se passar em um menor e menos interessante contingente) por conta do uso indevido das redes sociais. O fato é que a culpa não é da internet, nem das redes. Lembremo-nos, primeiramente, que homens e mulheres nada criam, senão com base em suas próprias necessidades. Legítimas ou não, quem somos nós para julgar? Entretanto, é inerente aos atos humanos, após concluirem uma etapa, criar uma próxima ou aprimorar a primeira. O estagnar não é natural e, embora sejamos animais racionais, ainda temos uma parte (de baixa aceitação) histórica e genética, que nos move. Ou seja, todo esse progresso tecnológico partira das necessidades apresentadas por um novo mundo, que vive em constante transformação, naturalmente.
O que acontece de errado é que as pessoas não sabem se utilizar das regalias que a vida em evolução promove. Num grande contingente como o ciberespaço, percebemos que muitas contas de redes são invadidas; visualizadas inadequadamente; atitudes são tomadas indevidamente; intimidades são reveladas, dentre muitos outros acontecimentos.
 Quem faz isso? Homens e mulheres. Talvez, incentivados pelas facilidades presentadas, mas que não se controlam diante da possibilidade de violar a ética do contexto em que estão inseridos. São pessoas que antigamente, talvez grampeassem linhas telefônicas e ouvissem as conversas na extensão; abririam cartas alheias e, agora, aproveitam-se do fato de que podem fazer essas coisas de forma mais eficaz e anônima pois, antigamente, um julgamento errado na mídia, podia gerar problemas.
Se algumas pessoas não têm controle de si mesmas diante desses dispositivos, devem abster-se deles, porque o problema é interno e pessoal. E, mesmo assim, maus caráteres que são, na ausência desses meios, agiriam de forma ilegítima em qualquer outra circunstância.
Os valores estão sendo substituídos, visando interesses pessoais s. A culpa, está cada vez mais em voga, atribuída: às traidoras que foram filmadas em sexo explícito com homens casados - ou aos adúlteros-; a quem expressou sua opinião negativa sobre alguém em conversa privada; àquele que contou algum segredo por meio do chat. NUNCA por quem adquiriu essas informações de forma indevida!
Não me admira, porém, que alguns membros da sociedade ajam de tal maneira, uma vez em que, assim fora desde tempos remotos e até dentro das igrejas.
 Dizemos, com facilidade, que o problema do país está na educação, referindo-nos à escola. Eu diria que parte da solução é inerente a ela. Porém, a educação só acontece quando sabemos sua definição. Encontramo-na primeiramente em casa, temos estímulos motivadores, ética, respeito e disciplina, como exemplo. Educação não depende somente do governo e não está somente na escola. Talvez "o problema" de fato, esteja na compreensão equivocada sobre o que é educação e nos locais diversos em que a experimentamos e exercemos. Da mesma forma que os indivíduos não devem por meio dos computadores substituir as relações inter pessoais, os conceitos não devem ser confundidos, de maneira particularmente conveniente.
Por tudo isso, tentemos aceitar o fato de que a tão aclamada: "culpa" não se deve atribuir à Internet. Podemos enxergar  as vantagens do progresso tecnológico pelas simples possibilidades de uniões familiares à longa distância; compras de produtos raros e necessários; informações fundamentais disponibilizadas; possibilidade de interação; facilidades no trabalho, dentre outras. Ademais, muitos diretos humanos estão sendo reivindicados com eficácia, por meio de organizações e manifestações, divulgadas na rede. 
 Não restam dúvidas, portanto, de que é o ser humano, aquele que estabelece seu próprio caos.
Estória para boi dormir

" Cause maybe you're lovable; maybe you're my snowflake"


            O desespero de uma amiga não me chocou, mas, o fato de se tratar de uma mulher diferente das que eu conhecia, que aparentava ter aprendido com a vida.
            A jovem Laji mora em uma terra muito distante, em outro planeta. Na verdade, em um subplaneta que pertencia ao território dos plutônicos. A população nessa região chega a quase 6,5 bilhões de habitantes.
             Laji, minha ciberamiga, tentava adiar o dia a chegar dentro de 24 horas. Era o fim do mundo. Católica (sim, o catolicismo chegou até lá) tentava se convencer de que poderia ir para outra parte do espaço, um lugar mais bonito e fácil de viver;  talvez merecesse. Porém, não podia ter certeza, não se sabe o quanto os pensamentos (e até o inconsciente) têm influência na decisão divina. Era difícil para ela acreditar que o inferno existia fora do território em que vivia, entretanto. E se estivesse enganada? Já tinha ouvido dizer que, no nosso planeta, o fim do mundo já havia sido anunciado várias vezes, mas nunca tivera se efetivado. No entanto, o planeta Terra, diziam os plutônicos, tinha maior desenvolvimento que o seu, anos-luz.  Ela indagava: "e  se o fim do mundo na Plutolândia fosse diferente do fim das outras formas de vida dos outros planetas" ? E se só o planeta dela estivesse fadado ao fracasso? Ademais, havia vida nos outros planetas, de fato? Ela nem tinha certeza se eu mesma existia, já que só nos comunicávamos pela internet - onde tudo é possível- inclusive, cultivar uma paixão. Isso também estava acontecendo na sua vida, de novo. Entretanto, ela não se preocupava.
            Como há anos ela aprendera fazer, ao sofrimento amoroso era dado três dias dentre os quais, chorar (pouco) só era permitido no primeiro. Doravante, só eram possíveis alguns deslizes, sem lágrimas e durante um curto  período do dia, a não ser que estivesse bêbada. Isso lhe aumentava a rotatividade e o controle administrativo do amor e da liberação de oxitocina.
            Pelo tumulto em que encontrava seu planeta, ela resolveu encontrar pessoalmente aquele com quem conversava quase todos os dias, no ciberespaço. Ele era da capital e ela resolveu ir até lá!  Enfeitou-se como se nunca mais fosse ver suas vestes preferidas; esperou ansiosamente, como se estivesse partindo a jato; levou 4 horas se embelezando, para não correr o risco de esquecer de nenhum detalhe. Uma vez em que tudo está para ser desfeito, não há porque não ser inteiro.
            Lá estava ela, ao lado do rapaz, sorrindo livremente, expondo seus gostos - sem desgostos - como se nada houvesse acontecido na sua vida, até então; como se fosse o primeiro dia de sua vida e como se o nada fosse se tornar tudo,  em seguida. Até lhe parecia coerente que as pessoas tivessem, somente "um dia de vida", na vida.
            Ele era o mediador de toda a beleza do planeta e das mais lindas palavras, também. Era aquele que trazia o carinho de modo que ela nunca havia experimentado antes. Os olhares eram diretos e profundos, por entre poucas e precisas palavras. Estas acertavam-lhes uma parte do corpo que pareciam desconhecer até o momento. Ela não suspirava mais alto para não parecer exagerada, ele denunciava sua exaltação; eles sorriam; ela, com o coração (dis)parado. Eles cantaram; gritaram; (so)riram; trocaram carinhos, palavras carinhosas;  apertos; disparates! Beberam; comeram; contaram piadas; falaram da vida e se declararam pois, não haveria amanhã.
            Lamentavam, enfim, o fim do mundo. Até então não o tinham feito pois, era costume dos habitantes daquelas bandas tentarem se controlar em demasia. Agora, não precisavam mais, estavam juntos em circunstância de total aceitação. As diferenças pareciam atraentes e as semelhanças eram divididas indiscriminadamente. Perto da chegada do fim, lamentaram ter se conhecido tão tarde. Consolavam-se pelo fato de morarem em territórios diferentes então, evitaram o sofrimento da saudade. Diziam que, se o mundo não fosse acabar, formariam a dupla perfeita. Ele era dominador, ela odiava ter que tomar decisões (sobretudo de última hora); ele liderava um grupo para cuidar dos guerreiros que iriam lutar contra o fim do mundo e ela estudava a força coletiva; ele relevava suas fraquezas pois, as via sob uma perspectiva cultural; ela o admirava ainda mais, por sua inteligência vir combinada a uma dose de esperteza; ele era a força e ela era o recanto. Tudo seria perfeito, se o mundo não estivesse a um segundo de "esvair-se pelo espaço". Ela agradecia a Deus e ao universo por ter tido a oportunidade de ter encontrado o que, há anos, imaginava o que era o "amar". [1]
            Era chegada a hora: ele foi trabalhar para o povo. Laji estava amedrontada pelas dores que poderia sentir, estava assustada com as suposições sobre as circunstâncias em que uma pessoa pode morrer, num caso desses. Além do mais, agora sentia o desejo de que o mundo continuasse a existir. A vontade de reencontrar aquele homem era ainda  maior ao medo de partir ou ao apreço pela sociedade plutônica. De tanta aflição, adormeceu.
            Mais tarde acordara com a notícia: o mundo não acabou. E, embora, sentisse que tinha aprendido a viver, somente às vésperas do suposto fim, encontrava-se em choque: não pelo possível caos, mas pelo fim do mundo que tinha construído na noite anterior. Laji não sabe explicar de onde saíra o que lhe parece um feitiço: se do cheiro; dos olhos apertados, cuja cor oscilava do verde ao cinza; ou da sensação de proteção que vinha do abraço em que caberia envolver todo um contexto. Sim, ele tinha ido embora.
            Posso imaginar algumas de vocês decepcionadas; outras, com expressão de que ainda estão esperando pela novidade do enredo. Eu mesma lhe disse: "sabia"! É certo, garotas, que isso sempre acontece!
            De fato, a vida em outro planeta é muito estranha. Onde estão com a cabeça aquelas mulheres? Logo diante do fim do mundo, ela tinha caído no conto do vigário[2].
            A jovem, horas depois, encontrava-se curvada, em oração. E, num momento de extremo e doloroso egocentrismo, pedia várias coisas ao mesmo tempo, para não perder a "viagem".  Ora, pedia para que o mundo acabasse de uma vez e lhe levasse a dor; ora para que a vida fosse eterna ao lado de seu amor.


"Ei! Acabou! Ainda esperando a novidade"?





[1] [Lá, amor é uma ação, o termo só existe enquanto verbo].
[2] [Pois é, lá na terra longínqua, a expressão é a mesma. Certas "coisas" não mudam, nem com a distância, desde antes do fenômeno de globalização].